É hora de falar de Semilunar quadrinho de 2017 do incrível quadrinista do interior de São Paulo, Camilo Solano. A HQ que além de conseguir expressar milhares de sentimentos e me destroçar por dentro, é capaz de inovar e ser reconhecida como um belo musical o que faz a experiência ser ainda mais emocionante e linda. É uma composição incrível em que tanto suas ilustrações com suas cores expressivas quanto sua história e a maneira como a narrativa se dá, conseguem demonstrar tudo isso. Vou explicar!
A poética dolorida de Semilunar
Semilunar conta a história de Maria e principalmente de como usa música para conseguir viver de maneira mais fácil. Acontece que Maria sofre de disfemia, um nome diferente para a gagueira. E é aí que a música entra.
A mãe de Maria, Dolores, é cantora e a ajudou a lidar com sua diferença usando músicas e, então, a música se tornou a coisa mais importante para a vida de Maria. Ela canta e toca violão, nunca um sem o outro. A mãe a ensinou a compor versos para que ela consiga se expressar melhor e de maneira mais fácil, mas o fato de saber lidar melhor com sua diferença não conseguiu afastar pessoas maldosas e adolescentes que fazem bullying.
A história de Maria é dolorida, ela não se encaixa, acha que não pertence a esse mundo, que não deveria pertencer. Entre tantos acontecimentos, Maria escreve músicas emocionantes, mostrando como ela realmente se sente, demonstrando que as coisas não têm sido fáceis, suas músicas mostram como viver pode ser complicado. O quadrinho é delicado e profundo.
A construção da narrativa
“Semilunar” tem uma narrativa diferente, uma narrativa fragmentada (e só Deus sabe o quanto eu amo narrativas fragmentadas). Há saltos na HQ, ou seja, o quadrinho é separado por várias partes de uma mesma história que fazem com que nós, leitores, fiquemos mais interessados e tentando entender melhor o que está acontecendo. Tudo fica claro ao fim da narrativa e, por conta de tudo fazer sentido só ao final, é como se fosse um choque, já que vimos indícios de tudo durante toda a história. Depois de terminar, a HQ pede que voltemos a folhear o quadrinho e assim vemos com outros olhos, tudo o que acontece.
Para separar cada pedaço da história, são colocadas duas páginas negras entre elas. Essas páginas também fazem parte da narrativa. Indicam uma espécie de silêncio, entre tudo que está sendo dito, para dar início a uma nova cena ou também podendo indicar o silêncio que a própria Maria dá ao contar sua história. As páginas pretas conseguem fazer a história ser mais marcante do que já é.
A experiência de ler Semilunar é ainda mais completa ao perceber os trechos de músicas que Maria canta. A cada espaço que a história dá, é uma oportunidade de ouvir um dos MPBs que Solano decidiu usar para compor a narrativa, o que fez parecer que as músicas foram feitas para sua HQ.
Solano diz que esse quadrinho foi inspirado em alguns momentos de sua vida e que surgiu de sua necessidade de aproximar o universo da música ao dos quadrinhos juntamente com as tragédias reais do dia-a-dia em que todos nós somos passíveis de passar. Ainda, como um extra ao quadrinho, Camilo Solano em seu canal, dispôs de animações dirigidas por Carlos Bucaretchi, para cada música autoral de Maria.
Eu recomendo essa linda produção independente e nacional que fez com que eu olhasse mais uma vez para as HQs brasileiras que são tão emocionantes quanto (e talvez até mais) que as produções internacionais que tanto amamos!