A Disney tem um ar de universo perfeito, a terra mágica e cheia de encantos. Mas a empresa já pisou bastante na bola em várias de suas animações e demais produções. Vacilos estes que, sobretudo hoje em dia, estariam longe de serem um conteúdo adequado para a família e também para a sociedade de um modo geral.
Corvos (Dumbo)
Este talvez seja um dos casos mais conhecidos em meio às polêmicas envolvendo personagens de animações da Disney. A animação tem um grupo de personagens composto por vários corvos cheios de trejeitos e fortemente estereotipados, associando claramente aos negros. É um grupo malandro, com falas carregadas e com gírias e liderados por um corvo de nome Jim Crow. Nome este que, por si só, já é um grande problema na animação.
Caso você não esteja familiarizado com o nome Jim Crow, segue uma contextualização rápida: Em uma viagem pelo sul dos Estados Unidos, um comediante chamado Thomas D. Rice descobriu que era comum entre os brancos comparar seus escravos à corvos (em inglês, Crow) tendo em vista a cor escura de suas peles. Thomas soube também que os escravos aparentemente cantavam uma canção sobre um personagem de nome Jim Crow.
Desprovido de bom senso, Thomas decidiu então atualizar o seu espetáculo e introduzir um ato em que este pintava todo o seu corpo de preto e performava a sua própria versão da música cantada pelos escravos. Como para o homem branco não existe limite para a falta de vergonha, o personagem de Thomas foi baseado exclusivamente na concepção deste do que seria um “negro típico”. Desta forma, o personagem do comediante era: um homem sem inteligência; atrapalhado; vestindo roupas velhas e completamente desgastadas e que andava feito um bobalhão.
Infelizmente, o personagem de extremo mau gosto de Thomas foi um sucesso na época e, com o tempo, o nome Jim Crow se tornou uma forma análoga pela qual os brancos se referiam aos negros, realçando o status de estes serem inferiores em todos os sentidos.
A questão “Jim Crow” se tornou um problema tão grande que, posteriormente, as leis de segregação racial criadas nos Estados Unidos receberam informalmente o nome de Leis Jim Crow (em inglês, Jim Crow Laws).
Agora, voltemos à Disney.
Como eu disse, apenas o fato de um grupo de corvos malandros, de andar “engraçado” e cujo líder se chama Jim Crow já é motivo mais que suficiente para fazer destes personagens não apenas muito polêmicos, mas também inquestionavelmente ofensivos. Porém, além disso, a Disney fez questão de que todos os corvos fossem dublados por dubladores negros de descendência africana, exceto justamente o líder Jim Crow, que foi dublado por um branco norte-americano.
Gatos Siameses (Várias animações)
Aparentemente criar um personagem polêmico não foi suficiente para a Disney, que precisou repetir mais duas vezes o feito em duas outras animações. Dessa forma, vamos passar por cada uma delas. É como dizem: já pode pedir música no Fantástico.
A Dama e o Vagabundo
Na animação A Dama e o Vagabundo, dois gatos siameses são personagens malvados e vilanescos. O problema maior nisso é que esses dois personagens estão cheios de características estereotipadas e racistas para com os asiáticos. Os dois gatos têm dentes tortos e disformes e olhos puxados. Eles também têm uma música cuja letra não é das melhores. A situação toda demonstrou muita insensibilidade por parte da Disney e obviamente não foi muito bem recebida pelo público asiático.
Aristogatas
Levantar a polêmica uma vez não foi o bastante. Em Aristogatas outro gato siamês é retratado com trejeitos e características ofensivas para o público asiático. O caso é menos alarmante que o anterior pelo fato de o personagem ser bem menos expressivo na animação. Ou seja, menos aparições, menos racismo. Mas ainda assim, está lá. Um gato siamês tocando piano com hashis, um prato de bateria sendo colocado na cabeça dele para parecer um chapéu chinês e falas estereotipadas em meio à música. Na versão norte-americana o gato repete “fortune cookie always wrong” com pronúncia errada várias vezes. Na música em português foram incluídas palavras trocando o “R” pelo “L”, como “galoto” ao invés de “garoto”.
Tico e Teco e os Defensores da Lei
Mas a Disney fez de novo. Dessa vez na série animada de Tico e Teco. Novamente dois gatos siameses aparecem em uma animação da Disney. Dois gatos estereotipados, líderes de uma organização criminosa.
Nos dois exemplos anteriores, a justificativa “eram tempos diferentes” atéééé pode ser aplicada, mas em Tico e Teco e os Defensores da Lei a coisa foi diferente. Acontece que a série animada foi produzida no começo dos anos 90. É inconcebível que um mesmo conceito racista como esse tenha sido perpetuado pela terceira vez em uma animação da Disney. Que coisa feia.
Índios nativo-americanos (Peter Pan)
Essa polêmica não se limita apenas à Disney, tendo em vista que quase todas as adaptações de Peter Pan cometeram o mesmo erro. Os índios nativo-americanos são retratados de forma completamente racista, ilustrando-os como um povo violento e primitivo. Essas características são ainda mais realçantes quando o povo indígena entra em contato com as crianças brancas inglesas, como se as diferenças viessem para criar uma comparação entre ambas raças. A animação conta também com uma música extremamente racista, que felizmente é uma das cenas menos lembradas em Peter Pan.
Pato Donald
É provável que você já tenha ficado sabendo sobre essa polêmica envolvendo o Pato Donald. Pode ser que você tenha pensado que a imagem de um Pato Donald vestindo uniforme nazista, lendo a obra de Adolf Hitler (Mein Kampf) pudesse ser uma montagem de muito mau gosto. Quem dera fosse, mas isso realmente aconteceu. Em um episódio, Pato Donald sonha que está na Alemanha nazista, trabalhando no que parece ser uma fábrica bélica ou algo do tipo, cercado por nazistas bem caricatos. E mais, essa animação ganhou o Oscar de Melhor Curta de Animação.
Essa foi uma das várias propagandas feitas pela Disney durante a Segunda Guerra Mundial como forma de apoio para as forças americanas que estavam lutando do outro lado do oceano. Porém, por razões óbvias, esse episódio foi muito pouco veiculado depois da guerra. Além dessa animação, outras propagandas animadas foram feitas também usando o personagem Donald, mas essa foi a mais famosa.
A intenção foi criar um conteúdo animado visando apoiar e reforçar o poderio norte-americano, mas é inquestionável que ver um personagem querido e popular como o Pato Donald envolvido com o nazismo é um tanto quanto perturbador. Sem contar que a existência dessa animação nos tempos modernos é bastante incômoda para os alemães, que fazem questão de deixar esse passado terrível para trás.
Jessica Rabbit (Uma Cilada para Roger Rabbit)
Jessica Rabbit é uma personagem muito icônica, até mais que o próprio Roger Rabbit, que é o protagonista do filme. Jessica é também bastante controversa, uma vez que ela é praticamente uma antítese à tudo o que a Disney representa. Ela é, provavelmente, a personagem mais sexualizada criada pela Disney. Isso já é um bom motivo para causar espanto e chocar a audiência, mas somado à isso ainda tem o fato de que ela é casada com Roger Rabbit, que é um coelho, literalmente. Para completar, alguns animadores desenharam a personagem sem calcinha em alguns frames, de modo que algumas coisas do filme tiveram que ser refeitas.
É óbvio que, gigantesca como é, a Disney não se limita apenas a essas polêmicas. Programas de TV e até atrações do parque já foram alvo de críticas devido ao conteúdo questionável que dispunham. Mas não só de erros consiste a Disney. Felizmente o currículo da empresa soma muito mais acertos que pisadas na bola. O importante é lembrar que errar é humano e que, em vista disso, o que podemos fazer é rever nossas atitudes e pensar em como podemos ser seres humanos (ou empresas) melhores e pelo menos a Disney tem feito esforços para mudar sua postura e manter esses conceitos atrasados no passado, onde eles pertencem. Nos vemos na próxima aventura!