MOXIE!, que traduzido do inglês significa bravura, é um filme baseado em um livro de mesmo nome, publicado pela autora Jennifer Mathieu. O longa foi dirigido por Amy Poehler, conhecida por participar em obras relevantes, como Meninas Malvadas, Divertida Mente, Parks and Recreation etc.
Amy é roteirista, atriz, comediante e produtora, sendo que em “Moxie” mostra duas de suas aptidões: atuação e direção. Mais adiante será visto o resultado desses trabalhos. Por enquanto, vale a lembrança de que se trata de uma obra adolescente com abordagem leve, reflexiva e moderna sobre o feminismo.
O roteiro ficou a cargo de Tamara Chestna e Dylan Meyer, que trouxeram drama e comédia à trama, de maneira comedida. Lançado no dia 3 de março de 2021, o filme pode ser encontrado na plataforma Netflix, com dublagem, audiodescrição e legenda em português disponíveis.
Para quem prefere a leitura, o livro foi publicado no Brasil pela editora Verus, em 2018. Ele conta com 288 páginas e foi traduzido por Ana Guadalupe. Pode ser encontrado na versão física e na digital.
Identidade, transformação e jornada
A trama acompanha a história de Vivian (Hadley Robinson), uma garota tímida de 16 anos. Ela costuma seguir as regras e é praticamente invisível na escola.
Isso muda quando uma aluna nova chega, chamada Lucy (Alycia Pascual-Peña), que fica indignada com os abusos praticados pelos meninos. Principalmente por parte de Mitchell (Patrick Schwarzenegger), o quarterback do time de futebol americano do colégio.
Inicialmente, Viv aconselha ignorar os ataques. Uma hora ele encontraria outra vítima. No entanto, acaba refletindo sobre o assunto e se revoltando, por causa de uma lista que os meninos publicaram. Nela havia apelidos e classificações pejorativas sobre o corpo e a personalidade das estudantes.
A partir daí nasce uma vontade de combater tudo que acontece de errado no ambiente escolar. Isso engloba a atitude dos rapazes e a dos responsáveis, como professores, diretores, pais etc. Logo, “Moxie” passa a questionar comportamentos, exigir melhorias e condenar silêncios ensurdecedores.
Assim, as meninas decidem se unir. O movimento acontece a partir de uma fanzine feminista criada e divulgada nos corredores do colégio por Vivian, anonimamente. Ela se inspirou na mãe, Lisa (Amy Poehler), uma integrante do movimento punk feminista underground nos anos 90, ou seja, era uma Riot Grrrl.
Com isso, a protagonista embarca em uma fase nova da vida, recheada de mudanças internas, desconstrução e autoconhecimento. Ela também conhece outras realidades, além de experienciar novos sentimentos sobre a sociedade e as suas próprias relações, seja de amizade, com Claudia (Lauren Tsai), seja de amor, com Seth (Nico Hiraga) e outras.
A organização e a luta diária
Uma das partes marcantes de “Moxie” é a diversidade do elenco, formado por pessoas negras, asiáticas, trans, com deficiência (PCD). Essa composição é importante, até mesmo por questão de representatividade. Mas, ao mesmo tempo que merece elogios, persiste em um erro corriqueiro.
No fim, os personagens giram em torno da protagonista, servindo como impulsionadores. Então acaba que vemos mais o lado de Vivian, que é branca e com privilégios, deixando as histórias e as necessidades das outras meninas um pouco de lado.
É claro que não daria para aprofundar todas, o filme é curto e já traz bastante informação, ainda que generalizada. Mesmo assim, um dos ensinamentos deixados é o de ponderar e discutir, então seria pertinente aproveitar o espaço para expor o desejo de mudar o foco de sempre. Para evitar ter mais do mesmo.
Afinal, reforçaria a ideia da interseccionalidade na perspectiva do feminismo. No sentido de entender, por exemplo, que além de ser mulher, ela é também negra. E, considerando a sociedade em que está inserida, muito provavelmente precisaria de demandas diferentes. Apesar dessa lacuna, as atrizes conseguiram criar brilho na tela, pela atuação e pelas suas características singulares.
Um pouco das estrelas de Moxie
Destaque para a Lucy (Alycia Pascual-Peña), por roubar a cena em algumas ocasiões, mas teve uma em específico que fiquei arrepiada. Literalmente. Ela falou de uma maneira tão firme, tão certeira, que não consegui não me comover.
Outra personagem que recebeu maior profundidade é a Claudia (Lauren Tsai), que tocou em um ponto geralmente esquecido. Ela é a melhor amiga de Vivian e compreende a importância do feminismo. Todavia, por questões culturais, pessoais e familiares, não consegue apoiar o movimento ou se expressar do jeito que gostaria, então acaba achando a própria maneira.
Considero essa uma mensagem muito significativa, por mostrar que para tudo tem um jeito e para enfatizar que o importante é que você faça parte. Qualquer ajuda é bem-vinda. É um grupo, uma força única , então cada um ajuda como pode.
Nesse sentido, tem até o par romântico da Vivian fortalecendo a ideia de que homens podem e devem participar. Nesses casos, é preciso respeitar o local de fala e aplicar os aprendizados no cotidiano, principalmente quando na rodinha de amigos. Vale mencionar que o Seth vira o par romântico ideal, enquanto o cara popular nem passa pela cabeça das meninas — ainda que romance não seja o foco (nem um pouco).
O palco é delas também
É impossível falar de “Moxie” e não comentar sobre a trilha sonora. Primeiro pelo fato de que a mãe de Vivian participava do Riot Grrrl!, um movimento artístico dos anos 90. Era voltado para o cenário musical e trouxe consequências sociais marcantes.
Na época, as mulheres reinvidicavam o espaço delas nos palcos, tidos como ambientes que transbordavam misoginia e estereótipos. Ao enxergarem tal situação, entenderam que queriam mulheres cantando e tocando, independente de ter habilidade ou não. O principal era a coragem e o direito de se expressar.
A partir dessa motivação, surgiram várias bandas icônicas e o sentimento de representatividade no ramo. A proposta era desconstruir e quebrar ideias preconcebidas. Pois bem. Sabendo disso, Moxie acertou demais na trilha sonora escolhida, valorizando o punk rock feminino.
Embalados principalmente pela música “Rebel Girl“, do grupo Bikini Kill, tem-se que o longa ganha um ritmo impactante e animado. Dá vontade de entrar na tela e participar com as meninas. Quanto às outras melodias, há mais bandas marcantes, como Cansei de Ser Sexy, com a canção “Alala” e The Linda Lindas, com “Big Mouth” e uma releitura de “Rebel Girl”. Também vale a menção para a música “La Vie En Rose“, de Lucy Dacus.
Juntas conseguimos mais
Antes de tudo, gostaria de fazer uma singela recomendação. Caso seja mulher e tenha tido vontade de assistir Moxie, indico convidar uma amiga para ver junto. Mesmo que por videochamada. Valerá muito a pena, para compartilhar angústias e para se sentirem reconfortadas. O longa terá ainda mais valor.
Enfim, de modo geral, considero “Moxie” um ótimo filme. Existem sim aspectos que poderiam ser melhor trabalhados, até mesmo menos lacunosos. Ainda assim, é uma obra que vale a pena, principalmente em termos de construção inicial.
É como se fosse um convite para descobrir que as mulheres podem e devem pedir por mais. Além de mostrar que não precisam passar por isso sozinhas ou se declarerem rivais, é mais fácil com o apoio de todas. É mais fácil quando você denuncia os problemas. Por isso, a dica é que assistam Moxie e conversem sobre isso. Em casa, nas escolas, em qualquer lugar, com todo mundo. O assunto tratado no filme é muito atual, essencial e indispensável para despertar a curiosidade e a consciência das novas gerações.